Informativo Jurídico - 003/2017
MANTIDA JUSTA CAUSA DE VIGILANTE QUE ATIROU NA PRÓPRIA MÃO AO TESTAR ARMA
O vigilante que dá um tiro na própria mão pode ser considerado negligente. E a falta é grave, pois desrespeita regras básicas de segurança. Por isso, sua dispensa por justa causa não pode ser revertida, decidiu a 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (Paraná).
O incidente aconteceu em janeiro de 2015, durante troca de turno entre dois vigilantes que prestavam serviços em uma fábrica de bebidas. Ao testar as engrenagens da pistola sem conferir se o tambor estava carregado, o trabalhador disparou a arma, atingindo a própria mão esquerda.
De acordo com uma testemunha, era de conhecimento de todos os vigilantes que a inspeção do armamento só poderia ser feita depois da confirmação de que o revólver estava sem munição, procedimento que era demonstrado em treinamentos e cursos de reciclagem periodicamente promovidos pela empresa empregava o trabalhador.
“Observe-se que a profissão do reclamante, vigilante armado, requer cuidados especiais e acima da média no manuseio de arma de fogo, porque qualquer deslize é capaz de gerar um resultado danoso de extrema gravidade”, ressaltou o desembargador relator do acórdão, Altino Pedrozo dos Santos.
“Comprovados em juízo os fatos que legitimam a dispensa por justa causa do empregado por desídia e indisciplina (artigo 482, ‘e’ e ‘h’, da CLT), em razão de disparo da arma de fogo por negligência, impositiva a manutenção da justa causa”, diz a decisão. O acórdão confirmou a sentença de primeira instância, proferida pelo juiz José Wally Gonzaga Neto, da 4ª Vara de Curitiba.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 13.03.2017
PL DA TERCEIRIZAÇÃO AMPLIA TRABALHO TEMPORÁRIO
O projeto de 1998 que o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), pretende votar na próxima semana com apoio do Executivo e de empresários para regulamentar a terceirização antecipa outra parte da reforma trabalhista do governo Michel Temer, e de forma mais ampla do que a defendida pelo próprio Palácio do Planalto: as mudanças no trabalho temporário. A proposta triplicará o prazo para esse tipo de contrato e permitirá o uso em muito mais situações.
O texto, encaminhado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), visava originalmente promover mudanças apenas nos contratos de trabalho temporários, feitos para substituir funcionários por um período determinado – como licenças médicas ou férias – ou acréscimo extraordinário de serviços, como as demandas sazonais geradas pelas vendas de fim de ano no comércio, por exemplo.
Com isso, as empresas reduzem custos por não precisarem ficar atreladas a um trabalhador ao longo de todo o ano, mesmo com menos serviços, ou arcar com os custos da demissão quando a demanda for menor.
Deputados e senadores, contudo, modificaram a proposta ainda no fim do governo tucano para regulamentar a contratação de mão de obra terceirizada, que passou a ser o centro das atenções do projeto e levou o governo Lula a paralisar as discussões em torno da matéria, que está em fase final de tramitação e, caso aprovada, seguirá para sanção presidencial.
Apesar das atenções voltadas para a terceirização, o projeto promove importantes mudanças nos contratos de trabalho temporário. Como já foi aprovado na Câmara e no Senado, os deputados devem decidir apenas qual dos dois textos será encaminhado para o presidente, sem possibilidade de alterar o conteúdo.
Uma das principais alterações é aumentar o prazo de contratação dos temporários dos atuais três meses para até nove meses (180 dias, prorrogáveis por mais 90 dias), que ainda pode ser ampliado por acordo ou convenção coletiva da categoria. A proposta apresentada pelo presidente Michel Temer no fim do ano propõe período menor, de até oito meses.
A mudança é criticada por sindicalistas. Para Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), maior central sindical do setor de serviços, um contrato de nove meses já não é mais temporário. “Esse tipo de contrato tem sua utilidade nos aspectos sazonais, mas as mudanças que estão fazendo terão impacto em todo o mercado que não está sendo percebido.”
Outro conflito com o texto de iniciativa do governo Temer é que a proposta de 1998 autoriza uma utilização muito mais ampla desse tipo de contrato. O PL 4302/98 permite, além de substituição temporária de funcionários e acréscimo extraordinário de serviços, o uso para ” demanda complementar” que seja fruto de fatores imprevisíveis ou, quando previsíveis, que tenham “natureza intermitente, periódica ou sazonal”.
“Essa mudança é muito abrangente. A lei diz hoje que o temporário é para uma atividade eventual. Com esse projeto, atividades rotineiras serão desempenhadas pelos temporários, que substituirão os contratados por tempo indeterminado e que tem mais estabilidade no emprego”, criticou o deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA). A própria reforma trabalhista do governo Temer mantém a limitação atual.
Por outro lado, os dois textos têm semelhanças, como dizer que a responsabilidade será subsidiária. Assim, o contratante só responderá judicialmente quando o funcionário esgotar as tentativas de cobrar da contratada – que costuma ter menos bens para penhorar – as pendências trabalhistas. Trabalhadores defendem a responsabilidade solidária, em que a contratante é acionada a qualquer momento.
Ambos os projetos ainda estabelecem período de “quarentena” para que o temporário volte a prestar serviços na mesma empresa nesta condição, impedem cláusulas de reserva que proíbam a contratação direta do funcionário pela contratante após o fim do acordo e determinam que o salário e jornada serão equivalentes aos dos funcionários contratados por tempo indeterminado para funções semelhantes.
“Se aprovar mesmo, esse projeto esgota a discussão sobre a da ampliação do tempo e de outros direitos”, afirmou o relator da reforma trabalhista na Câmara, deputado Rogério Marinho (PSDB-RN). O texto do governo Temer ainda está no começo da tramitação e precisará passar por toda a discussão na Câmara e Senado antes de seguir para sanção.
A principal mudança no projeto do governo, e que não consta na projeto que será votado ainda em março, é a permissão para contratação direta dos temporários, sem necessidade de uma empresa para intermediar essa relação. A matéria de 1998 mantém a exigência já prevista na lei de uma prestadora de serviços mediar o vínculo entre o temporário e a empresa contratante.
Para o atual relator do projeto de quase 20 anos atrás, deputado Laércio Oliveira (SD-SE), vice-presidente da Confederação Nacional do Comércio (CNC), a contratação direta é “absurda”. “Isso vai quebrar o setor. Lamento profundamente o governo apresentar o projeto dessa forma, que vai inclusive fragilizar a relação entre trabalhador e empresa e estimular a informalidade nesse tipo de contratação”, afirmou.
Relator da nova reforma, Marinho disse que ainda não tem posição clara sobre a contratação direta, um dos temas que pode ficar para a comissão especial da Câmara analisar. “Ainda vou ponderar e ouvir as opiniões nos debates. Mas a própria Organização Internacional do Trabalho (OIT) diz que a intermediação facilita a fiscalização”, pontuou.
Fonte: Valor Econômico, por Raphael Di Cunto, 13.03.2017.
PARA CUMPRIR COTA LEGAL DE EMPREGADOS COM DEFICIÊNCIA, NÃO BASTA PUBLICAÇÃO DE ANÚNCIOS: EMPRESA DEVE SE EMPENHAR NA ADAPTAÇÃO DO LOCAL E DA ROTINA DE TRABALHO
“Não bastam atitudes cômodas ou atos formais, tais como publicação de anúncios ou solicitações a agências de empregos, para a empresa se desvencilhar da obrigação de atingir a cota mínima de contratação de trabalhadores com deficiência. Exige-se que ela providencie a preparação do local e da rotina de trabalho, para que, de fato, promova a inclusão desses cidadãos na vida profissional. É que a obrigação da implantação de um ambiente de trabalho aberto, inclusivo e acessível, de acordo com o artigo 27 da Convenção Internacional de Nova York, cobra uma atitude afirmativa de responsabilidade social da empresa, visando garantir o direito ao trabalho digno das pessoas com deficiência”. Adotando esses fundamentos, expressos no voto do relator, desembargador José Eduardo de Resende Chaves Júnior, a Primeira Turma do TRT-MG julgou desfavoravelmente o recurso de uma empresa de transporte de passageiros e manteve a multa que lhe foi aplicada pelo MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) pelo desrespeito da cota mínima legal de contratação de trabalhadores com deficiência.
Esforço não demonstrado – O auto de infração emitido contra a empresa registrou o descumprimento da cota de 5% prevista no inciso IV do artigo 93 da Lei nº 8.213/91, tendo em vista que, na época, ela contava em seus quadros com apenas nove empregados com deficiência ou reabilitados pelo INSS, quando, pela norma legal, deveria contar com pelo menos 157, já que possuía mais de 1000 empregados. E, além disso, conforme observou o relator, a empresa não demonstrou que tomou todas as medidas necessárias para tornar possível a contratação desses trabalhadores.
Uma testemunha chegou a afirmar que publicava anúncios, inclusive em jornais, solicitando candidatos para preencher as vagas na empresa destinadas aos trabalhadores com deficiência. Mas, em seu exame, o desembargador constatou que nenhuma cópia desses anúncios foi apresentada. Ele também comentou a afirmação da empresa de que teria realizado convênios e contatos com entidades governamentais e privadas buscando promover a admissão de trabalhadores reabilitados ou com necessidades especiais em seus quadros: “A ré não preparou o ambiente de trabalho para torná-lo acessível e inclusivo. Simples atos formais, como publicação de anúncios ou realização de convênios, não suprem o que se apresenta como a responsabilidade social da empresa contemporânea, após a incorporação no ordenamento nacional da Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência”, destacou o desembargador.
Tutela internacional – Para fundamentar a decisão, o julgador citou o artigo 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), que prevê que todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos, consagrando o princípio da igualdade. Ressaltou, no mesmo sentido, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966) que estabelece que os direitos ali previstos serão exercidos sem discriminação de qualquer natureza. No âmbito internacional trabalhista, ele lembrou que as Convenções 100 e 111 da OIT vedam o tratamento discriminatório no campo das relações de trabalho, citando a Convenção 159 que, especificamente, trata da reabilitação profissional e inserção das pessoas com deficiência no emprego.
Ainda no plano da tutela internacional, o relator deu especial destaque à Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Nova York, 2007) que, conforme explicou, foi ratificada no Brasil com quórum qualificado de emenda constitucional e cujo conceito de deficiência, na visão do desembargador, representa um avanço em relação às legislações tradicionais que normalmente enfocavam o aspecto clínico da deficiência: “As limitações físicas, mentais, intelectuais ou sensoriais passaram a ser consideradas atributos das pessoas, o que possibilita afirmar-se que a deficiência é a combinação de limitações pessoais com impedimentos culturais, econômicos e sociais. Assim, deslocou-se a questão do âmbito do indivíduo com deficiência para as sociedades, que passaram a assumir a deficiência como problema de todos”, ressaltou, em seu voto. E completou: “Com a Convenção de Nova York, formou-se a ideia de que as limitações de caráter físico, mental, intelectual ou sensorial são atributos pessoais que se acabam por restringir o acesso aos direitos, não pelos efeitos que tais impedimentos produzem em si mesmos, mas, principalmente, em consequência das barreiras sociais, ambientais e culturais impostas pela sociedade”.
Continuando a discorrer sobre as razões jurídicas que o levaram a reconhecer a validade do auto de infração e da multa aplicada à empresa, o relator observou que o artigo 27 da Convenção de Nova York reconhece o direito das pessoas com deficiência ao trabalho, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, “direito este que possui status constitucional, traduzindo-se em direito humano e fundamental”, frisou. Ponderou, ainda, que o trabalho representa meio de inserção social da pessoa com deficiência, proporcionando-lhe condições para vida digna, já que possibilita não apenas sustento material, mas a convivência social e o desenvolvimento das aptidões e potencialidades da pessoa.
Sistema de cotas: solução nacional – No Brasil, explicou o desembargador, a tutela normativa e principiológica da pessoa com deficiência centra-se nos artigos 5º, caput e 3º, IV, os quais, em conjunto, asseguram a igualdade substancial e autorizam o Estado a adotar ações afirmativas (políticas públicas e de integração social) com o intuito de concretizar o princípio da dignidade da pessoa humana. E, conforme destacou, não é demais lembrar que todos os direitos contidos na Convenção das Pessoas com Deficiência são normas constitucionais, em virtude da ratificação, pelo Brasil, do tratado da Organização das Nações Unida com quórum de 3/5.
“Como forma de promover a inclusão social do trabalhador com deficiência, com fundamento no princípio da igualdade substancial, o artigo 93 da Lei 8.213/91 criou, assim, um sistema de quotas. Trata-se de obrigação de cunho eminentemente promocional, decorrente da função social da empresa, em que ela deve tomar todas as medidas ambientais e sociais para inspirar a pessoa com deficiência a lhe prestar serviços, de forma subordinada. Neste sentido, é dever da empresa instituir programa de inclusão social da pessoa com deficiência, que envolve, não só a publicação de anúncios e o contato de agencias de emprego, mas também a preparação do ambiente e da rotina do trabalho, o fornecimento de treinamento e, ainda. a acessibilidade, tudo para que permitir a real inserção da pessoa com deficiência no ambiente produtivo da empresa. E a imposição de implantação de um ambiente propício à contratação desses cidadãos cobra da empresa atitudes afirmativas de responsabilidade com o trabalho aberto, inclusivo e acessível, decorrente da responsabilidade social da empresa estabelecida na Convenção Internacional de Nova York, especialmente no seu artigo 27″, frisou o julgador.
Ambiente inclusivo e igualdade de oportunidades – E não parou por aí. Partindo para a legislação nacional, o desembargador salientou que, para imprimir ampla aplicação à Convenção Internacional de Nova York, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, a recente Lei 13.146 de 6 de julho de 2015, especificou ainda mais os princípios consagrados na Convenção, impondo ao empregador a responsabilidade social e trabalhista de, não apenas abrir vagas, mas também de garantir um ambiente de trabalho acessível e inclusivo, ao dispor, em seu artigo 34, que: “A pessoa com deficiência tem direito ao trabalho de sua livre escolha e aceitação, em igualdade de oportunidades em ambiente acessível e inclusivo com as demais pessoas.§ 1o As pessoas jurídicas de direito público, privado ou de qualquer natureza são obrigadas a garantir ambientes de trabalho acessíveis e inclusivos”.
Além disso, continuou o relator, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência – LBIPD, determina que a inserção desses trabalhadores se processe de forma competitiva, ou seja, de maneira que possam competir em igualdade de condições com os demais trabalhadores, seja com a preparação do ambiente de trabalho, seja com o fornecimento de recursos de tecnologia assistiva: “Art. 37. Constitui modo de inclusão da pessoa com deficiência no trabalho a colocação competitiva, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, nos termos da legislação trabalhista e previdenciária, na qual devem ser atendidas as regras de acessibilidade, o fornecimento de recursos de tecnologia assistiva e a adaptação razoável no ambiente de trabalho”. E, no mesmo sentido da Convenção Internacional de Nova York, essa lei também consagra a responsabilidade social da empresa na promoção da inclusão dos trabalhadores com necessidades especiais, estabelecendo que deve ser incentivada não só pelas políticas públicas, mas também pela gestão privada.
Descaso reiterado – “No caso, percebe-se do auto de infração que a ré foi notificada para comparecer na Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Minas Gerais, mas não apresentou defesa e nem mesmo compareceu no órgão no dia e hora marcados. Não se pode deixar de registrar, também, que consta do auto de infração que a reclamada já havia sido autuada por duas vezes (anos de 2007 e 2012) pelas mesmas razões e que a quantidade de empregados com deficiência ou reabilitados diminuiu sensivelmente no ano de 2014 (de 22 para 9 empregados), apesar do número geral de empregados ter aumentado”, registrou o relator, na decisão. Para finalizar, ele frisou que a ré não fez prova convincente de que, de fato, se esforçou para preencher a totalidade do percentual de vagas destinadas a pessoas reabilitadas pela Previdência Social ou com deficiência.
Por todas essas razões, a Turma concluiu pela validade do auto de infração do Ministério do Trabalho e Emprego, que goza de presunção de legitimidade, sendo mantida a multa administrativa aplicada à ré pelo descumprimento da cota mínima prevista no artigo 93 da Lei nº 8.213/91.
( 0010215-31.2016.5.03.0110 RO )
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região Minas Gerais, 13.03.2017